Labirinto do Fauno
João
Pessoa, 25 de julho de 2015
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A velha vitrola ainda toca aquela canção calorosa, o dia chuvoso é
um convite ao ócio -
“Deixe-me
ir, preciso andar, vou por ai a procurar, sorrir pra não chorar.
Quero assistir ao sol nascer, ver as águas dos rios correr. Ouvir os
pássaros cantar. Eu quero nascer, quero viver. Se alguém for
perguntar, diga que sou vou voltar depois que me encontrar.”
Querido
amigo, faz tempo que não te escrevo, é que tem acontecido várias
coisas na minha vida, não sei como posso explicar, mas ela anda meio
estranha, bem, espero que você entenda enquanto tento explicar
alguma coisa a seguir. Espero também que você se divirta e não me julgue
por ter me afastado por tanto tempo, eu tentei mudar, juro
que tentei, enfim, vamos lá.
Como
dizia um grande poeta, em teoria, a essência das coisas é simples,
mas quando posta em prática tornar-se-á complexa pra cacete. E eu
aprendi isso da maneira mais abrupta possível. Os dias vem passando
meio tortos em meio ao frio que o mês de julho trás consigo. A
melancolia e uma provável tristeza começavam a tomar conta da alma
do nosso não tão nobre herói. Por que? Sabe-se lá, é tudo tão
incerto. O futuro me assusta, e a você?
Outro dia sai de casa para ir a aula,
tomei banho, comi, me troquei, tomei meu ônibus e segui – essa é
a parte que mais gosto, no caminho da casa à universidade posso
pensar sobre tudo e nada ao mesmo tempo, é um momento de completa
reflexão tão qual o banho, ou vai dizer que você também nunca
devaneia nos locais mais insólitos? - na sexta parada sobe uma
garota de semblante interessante, mas ela me parecia meio atordoada.
Não é da minha conta a vida de ninguém, mas segui viajem vidrado
naquela criatura, seus cabelos escuros contrastavam com a palidez de
sua pele e seus belos 'olhos mais negros que as asas da graúna' (se
me permite a citação). Como disse, parecia triste com seu livro de
capa roxa molhado, curioso, parecia que eu conhecia aquele livro.
Minha
parada se aproximava, levanto, o ônibus para, desço, tomo meu rumo.
Sim, exatamente tudo bem direto e seco, a calidez do dia tinha se
esvaído com a chuva que parava de escorrer. As mesmas aulas de
sempre, tudo como sempre, só esse pensamento que não saia da minha
cabeça. Quem raios
seria aquela? Como
você sabe, minha memória não é das melhores, as vezes mal lembro
o que comi no café da manhã, porem, aquela cena tinha me perturbado
de uma maneira curiosa. Fim das aulas e nem tive que ficar no
laboratório, perfeito, precisava adiantar uns afazeres mesmo.
Por semanas a fio tenho visto a mesma
garota, repetindo a mesma cena, diariamente no mesmo ônibus que
tomo. Nunca consigo trocar uma palavra com ela, apenas sento e admiro
suas feições até que a viagem termine.
Ontem, preparei-me como de costume
para mais um dia como de costume, esperando vê-la novamente. Só que
nesse dia ela não tinha aparecido. O que aconteceu? Era a única
coisa que vinha a minha mente, ela sempre tava lá, sempre e agora
não mais. Será que ela tinha percebido que eu a observava?
Convenhamos que isso é um pouco estranho, é, eu sou estranho, mas
'perseguir' uma pessoa já é demais. Eu não queria fazer isso,
juro. Então quando minha viajem findara notei um volume estranho no
meu bolso, era um papel aparentemente escrito a punho com os dizeres
“Não
se cobre tanto, de verdade. A loucura é ponto de vista, você é
normal, não é só porque você não concorda e tá diferente que
você é, de fato, diferente. Não se preocupe, eu acredito em você,
mas agora tenho que ir, fico feliz em ter ajudado. Um beijo.”
Quem
era ela? Nunca descobri, mas me ajudou pra caramba. Talvez fosse a
personificação da minha loucura, um anjo da guarda ou um monstro do
pântano, sei lá, só sei que depois de ler aquele bilhete minha
vida melhorou um pouco. Enfim, cara, sinto sua falta e espero
que você me responda logo. Talvez eu te visite nas minhas férias,
mas preciso resolver outras coisas por aqui antes. Manda um abraço
pra sua mãe e espero que o filhote esteja bem e crescendo forte.
Att.: Eduardo
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